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ACESSO À JURISDIÇÃO ARBITRAL E OS CONFLITOS DECORRENTES DAS RELAÇÕES DE CONSUMO

    1. Em linha de princípio, os conflitos decorren­tes de relações de consumo podem ser soluciona­dos por intermédio de jurisdição estatal tradicional (justiça comum), alternativa ou especial (juizados cíveis) bem como através de jurisdição paraestatal (juízo arbitral), a medida que versam sobre direitos patrimoniais disponíveis (admitem transação), sem contar com a possibilidade de autocomposi­ção através de técnicas não-adversárias, tais como a mediação.

 

    2. Tendo em vista que a arbitragem é instituto de natureza contratual jurisdicionalizante adversa­rial, não é a forma mais adequada para resolução de conflitos decorrentes de relações de consumo, destinando-se sobremaneira à solução de ques­tões cíveis ou mercantis, nacionais ou internacio­nais, de grande ou médio porte, considerando-se que os consumidores dispõem nestes tipos de con­trovérsias específicas, de outras técnicas e instru­mentos menos ortodoxos, simples, informais e eco­nômicos, tais como a mediação e os Juizados Especiais Cíveis.

 

    3. De regra, a indicação em cláusula compro­missória cheia ou vazia, de solução de conflitos eventuais e futuros por intermédio de juízo arbitral em relações de consumo decorrentes de contratos padrão ou de adesão, é nula de pleno direito, podendo o consumidor rechaçá-lo perante o Esta­do-juiz, em demanda apropriada definida no art. 7° da Lei 9.307/96, ressalvando-se sempre a hipóte­se de iniciativa ou concordância do consumidor em instituir a arbitragem, firmando o compromisso (art. 9°) de ratificação da cláusula cheia ou para definir os termos do art. 10 da mesma Lei.

 

    4. Não terá qualquer validade ou eficácia a con­venção arbitral que exclua ou limite os direitos do consumidor definidos na Codificação específica, não se aplicando, neste particular, o disposto no art. 2° da Lei 9.307/96, em "face do disposto no art. 1° do CDC.

 

    5. Se o consumidor concordar em firmar o com­promisso arbitral e se for efetivamente instituído o juízo privado, não mais poderá recalcitrar ou ale­gar em demanda futura a nulidade da cláusula compromissória, ressalvadas as hipóteses defi­nidas nos arts. 32 e 33 da LA.

 

    6. Definida a cláusula compromissória (cheia ou vazia) em contrato de consumo de livre estipu­lação (ou seja, não de adesão ou padrão), a insti­tuição do juízo arbitral é medida que se faz impe­rativa: ressalvada a demonstração preliminar de inobservância de norma ou princípio de ordem pública norteadores do CDC do comprometimen­to do árbitro, tribunal arbitral ou entidade arbitral, por parcialidade ou conluio com o produtor ou for­necedor.

 

    7. Tratando-se de contrato tipicamente de ade­são (em relações de consumo ou não); inadmis­sível a ingerência do aderente em procurar inserir cláusula arbitral, tratando-se de ressalva absolutamente inócua aquela formulada no § 2º do art. 4º da LA, tendo em vista que nessa modalidade contratual não se há de falar de “iniciativa do aderente”, sob pena de manifesta antinomia.

 

    8. Nos contratos de adesão ou padrão decorrentes de relações de consumo, a cláusula compromissória cheia ou vazia só terá eficácia se o aderente tomar a iniciativa de instituir a arbitragem, ou, concordar expressamente com a sua instituição, a medida que, em situações desta natureza, preponderam as regras específicas do CDC no confronto com qualquer outra de caráter geral, inclusive o art. 4º, § 2º da Lei 9.307/96.

 

    [*] Síntese em forma de conclusões/teses da palestra proferida no “V Congresso Brasileiro e III Congresso Mineiro de Direito do Consumidor”. Belo Horizonte, 3 de maio de 2000.